Li esse artigo no O Globo on line e achei muito interessante, por isso, resolvi republicá-lo aqui no blog.
Quando estava prestes a desembarcar na África para a sua primeira visita oficial, o Papa Bento XVI chocou, uma vez mais, a opinião pública mundial ao declarar que a distribuição de camisinhas não é uma política eficiente no combate à Aids. Correndo o risco de incomodar ainda mais o consenso politicamente correto e progressista que vige no mundo, devo dizer que Sua Santidade acertou em cheio.
Em primeiro lugar, cumpre desfazer alguns erros crassos e deixar claro aquilo que o Papa realmente disse - refutando aquilo que lhe foi atribuído pela mídia. Bento XVI não afirmou que a camisinha não serve para evitar a contaminação pelo HIV. O que fez foi criticar as políticas públicas que se baseiam apenas na distribuição agressiva de preservativos sob a justificativa de erradicar um mal que, desafiando a lógica de alguns, insiste em crescer.
Em verdade, a fala do Papa incomoda os progressistas do mundo porque ele foi direto ao ponto, falando daquilo que o consenso mundial insiste em esquecer: os valores morais. De fato, antes de decidir usar camisinha, o ser humano deveria se indagar sobre a conveniência - ou não - do ato sexual propriamente dito. Como não é um mero animal dotado de instinto, mas uma criatura racional, é perfeitamente justo exigir um comportamento condizente com o tamanho do seu cérebro.
Manter uma relação tão íntima com outra pessoa é uma decisão carregada de reflexos sentimentais e morais, apesar do que insistem em pregar os novos iluministas do mundo, para os quais sexo é apenas sexo. Estão errados! Uma relação sexual é possivelmente a forma mais íntima de contato entre dois seres, razão pela qual é justo que surjam indagações acerca da oportunidade, da conveniência e dos reflexos decorrentes. Deixar tudo isso de lado porque se tem uma camisinha para evitar doenças e filhos é, no mínimo, primitivo e obscuro.
Convenhamos: o que fazem as campanhas públicas sobre o uso da camisinha? Incentivam a prática desenfreada e descompromissada do sexo. Sexo seguro, dirão alguns. Sim, pode ser. Mas isso não tira o fato de que o Estado, tal como um moderno alcoviteiro, continua patrocinando o encontro sexual das pessoas sem colocar para a sociedade a questão primordial que deve, sim, ser feita. Em outras palavras, podemos todos concordar que é preciso usar camisinha, mas esse é um segundo momento da coisa toda. Antes de recorrer ao famoso látex, há que se saber se aquele encontro íntimo é bom, conveniente e não deixará sequelas desagradáveis para nenhum dos envolvidos.
O problema é que o pensamento politicamente correto que comanda as mentes do mundo acha que falar de valores morais é coisa de conservadores, caretas e reacionários. Moderno e humanista, para essa gente, é defender a cultura da morte, manifestada diariamente por meio da defesa ostensiva do aborto, por exemplo. Muitas vezes, o objetivo último de certo progressismo nem é prevenir a Aids, mas simplesmente atacar a Igreja Católica, culpada recorrente por todos os males do mundo.
Qualquer deita neopentecostal de esquina pode dizer o que bem entender, sempre em nome da diversidade e da tolerância religiosas. Assim, mesmo quando Edir Macedo usa, de forma estúpida, uma passagem bíblica para defender o aborto, as tolices são lidas como um lampejo de iluminismo religioso, em contraponto ao suposto conservadorismo do Vaticano. A qualquer um é dado opinar sobre temas os mais diversos, exceto à Igreja Católica. Basta que o sucessor de Pedro abra a boca para tratar da pena de morte, da eutanásia, do aborto, ou do combate à Aids e pronto: o mundo se apressa em refutar seus argumentos. A tolerância, como se vê, não se aplica ao catolicismo, réu de impor aos homens o dever de arcar com os reflexos morais de suas escolhas individuais.
Culpar o Papa - e, em última instância, a Igreja - pela proliferação da Aids é, na melhor das hipóteses, coisa de fronteiriços. Ora, basta um pouco da boa e velha lógica cartesiana para derrubar essa tese: se todos seguissem à risca as normas da Igreja, não haveria contaminação nenhuma, não é? Afinal o Vaticano defende a abstinência sexual por meio da qual, admita-se, ninguém contrai uma doença sexualmente transmissível Ou vamos acreditar que alguém primeiro escolhe desobedecer a Igreja - ao praticar sexo irresponsável - e, depois, decide obedecê-la - dispensando o preservativo?
Claro que os modernistas vão dizer que pregar a abstinência é ridículo, mas isso é próprio de quem decidiu que o ser humano precisa se comportar apenas como um animal dotado de instintos. Sabem qual é o país que melhor combate a Aids na África? Uganda. Dos anos 80 até agora, houve uma redução na população contaminada, de 30% para 7%. E qual é a principal política pública adotada? O incentivo à abstinência e ao sexo com compromisso. Sabem por que é tão difícil acreditar em algo assim? Porque o pensamento politicamente correto já obteve considerável sucesso em reduzir o mundo a uma manada de animais desprovidos de vontades individuais.
Torna-se, assim, mais simples atacar a pessoa do Papa e desmerecer seus argumentos, em vez de nos debruçarmos sobre o que ele falou. Ao lembrar que a distribuição maciça de camisinhas não foi suficiente para aplacar a disseminação da Aids, Bento XVI não disse nenhuma mentira, nem errou em sua análise. O que fez foi lembrar que o sexo casual e descompromissado é, sim, uma vertente do sexo irresponsável. A camisinha se torna uma espécie de algoz de sua suposta virtude, pois estimula - e isso é inegável - o sexo ligeiro e sem compromisso.
O curioso é que a pecha de obscurantista recai sobre o Papa- e sobre o catolicismo -, mesmo estando claro que os críticos de Bento XVI são aqueles que pretendem transformar o ser humano em uma espécie de animal que vive num permanente cio, pouco importando como ou com quem mantém relações. É exigida apenas a camisinha. Assim, todo um leque de escolhas morais é relegado ao segundo plano, substituído pela escolha física de responder aos instintos. Quem são, afinal, os obscurantistas?
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