3 de mar. de 2019

Diário Missionário: conhecendo Curralhinho

22 a 24 de fevereiro de 2018
No café da manhã antes de visitar as famílias. 

O relato desses dias foram escritos uma semana depois, o que pode vir trazer como prejuízo a ausência de fatos relevantes pelo esquecimento, mas senti que deveria escrever a experiência que estou tendo a cada final de semana através da Pastoral, uma das colunas na formação de um candidato ao sacerdócio. 


Estou em missão neste ano em Ocara, a quase 100 km de Fortaleza, junto com o seminarista Deusimar. Nosso pároco é padre Aurênio e a Paróquia é dedicada à Sagrada Família e São Sebastião. Possui 41 comunidades, e algumas bem distantes. 

Em nosso segundo final de semana em missão fomos enviados para a comunidade de Curralhinho, a mais distante e mais necessitada. O caminho para chegar até lá estava molhado por conta das intensas chuvas, poderia até está pior, mesmo assim requiriu habilidade da motorista. Foi Regiane que nos levou em seu possante, um fiat uno guerreiro, segundo o seu bom humor, a "hilux de pobre". Regiane conhece como ninguém cada caminho, comunidade e nos deu preciosas dicas. 
Caminho enlameado por conta das chuvas. 


Logo ao chegar ao povoado, depois de passar por várias comunidades, uma criança miudinha ao ver o  carro correu para avisar que os seminaristas estavam chegando. A cena foi bem engraçada. Logo muitas outras crianças e adolescentes nos cercaram. Era bem como nos tinham dito, a comunidade tinha muitos infantes. 

Dona Rita, a coordenadora da comunidade, nos acolhera com extrema simpatia, beijos e sorrisos cheios de alegria. Recolheu nossos pertences, elencou onde faríamos as refeições e disse que as crianças que nos acompanhariam. E de fato, assim foi feito. A primeira parada foi na Liduina para tomar café com bolos deliciosos. 
Com a dona Rita, coordenadora da comunidade. 


Tímidas, aos poucos, as crianças, que seriam nossas companheiras de missão foram se soltando. Ariane, Janyce, Matheus, Wangêlo, Larice, Catarina, Kassandra, Leide, Daiane  e Ramom foram nossos guias.  O Vângelo logo me chamou atenção, silente ia à frente do grupo, abria as porteiras e ficava por último para fechá-las. Foram as crianças  mesmas que fizeram o roteiro das visitas. Escolheram os idosos e enfermos, aqueles que não podiam mais se dirigirem à capela. 





Fomos bem recebidos em todas as casas, é muitas situações de "cortar coração". Conhecemos  um povo pobre, sofrido, marcado pela dor, ao mesmo tempo, amparados pela generosidade uns dos outros. Não vimos nenhum enfermo abandonado, todos, a seu modo, tinham o mínimo de carinho e cuidado para viverem situação tão penosa. 

Comoveu-me bastante a situação do Zezinho, um jovem de 17 anos, acamado, vítima de um acidente que o deixara sem andar. Estava sobre uma cama, com rádio ao lado e um amigo que sempre o acompanha, uma criança, um anjo de Deus. Faz tratamento no Albert Sabin, mas, em breve, por conta da idade, precisará sair de lá. Reforcei a importância dele procurar o Sarah, especializado nesse tipo de atendimento. 
As crianças preparam um pic-nic para nós. Como não amar!



Pelo que sabemos,  a comunidade já sofreu com vários estigmas como a violência e a prostituição. Mas um novo desafio desponta, alguns casos de suicídios. Estes aliás, se espalham em várias de nossas cidades, uma verdadeira epidemia que evoca uma ação inteligente e evangelizadora de nossa parte. Precisamos chegar a estes irmãos que padecem por tamanha falta de sentido de vida. 

Voltsndo ao Curralinho, andamos muito. A comunidade tem pouco mais de 90 famílias, mas localizadas em pontos distantes. No retorno foi-nos preparada uma surpresa. As crianças nos conduziram por um caminho por onde precisamos atravessar o rio, que devido às chuvas começava a encher. A surpresa? Um pic-nic em um dos pontos à beira do rio. Gesto de acolhimento muito bonito, tudo preparado por eles. Quanto carinho. 

A tarde foi de descanso e convivência com dona Rita, ela que se orgulhava de cuidar da família, da Igreja e do roçado. Tudo isso aos 69 anos, mas com uma vitalidade invejável. À noite a capelinha encheu para a celebração da palavra. Foi conduzida pelo Deusimar. Todos prestaram muito atenção e após o momento ficamos trocando saudações. 

Ao final, uma bela surpresa. O pequeno Vângelo havia preparado um presentinho para mim e o Deusimar, uma caixinha envelopada por ele, com balas, chocolate e uma mensagem. Verdadeiramente, mensagem de um anjinho de Deus. 

Recebendo o presentinho do pequeno Ângelo. 

Algo que observei  digno de nota, nas muitas casas que visitamos,  todas de alguma forma indicavam que quem morava ali era ouvinte de padre Reginaldo Manzotti. Dona Rita mesmo é umadessas. Possui a capelinha das Santas Chagas peregrina. A ação evangelizadora do padre de Curitiba chega lá naquele rincão.



Depois da celebração fomos para a casa do Ednardo e da Eliane, são coordenadores da comunidade vizinha do 80. Fomos muito bem recebidos, conversamos e o assunto gravitou em torno das chuvas, do açude do Batente, que tivemos a oportunidade de conhecer no outro dia, realidades da comunidade e a missão de servir ao Senhor.



A sangria do açude era motivo de alegria para todos, água é, de fato, vida e tem um sentido muito especial para o homem do campo. Voltamos para a cidade pela estrada ainda mais brejada por conta das precipitações que não deram trégua. 

No resto dia tivemos encontro preciosos com irmãos da comunidade Luz de Deus, na casa do Jhonhy, o "sopinha". Muita conversa boa, mais um pouco de descanso, Missa na Matriz e retorno para o Seminário ao final da noite. Como Deus é maravilhoso, vai nos mostrando aos poucos como um dia viveremos para sempre.

O assunto da sangria do açude Batente repercutiu em vários veículos de comunicação do Estado. 









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